A pandemia de COVID-19 forçou as equipes comerciais a adotarem, em larga escala, um modus operandi bastante diverso do que vinha sendo posto em prática, de modo geral, pela gestão de vendas. Tal reconfiguração vem como uma resposta aos desafios que vão se estender para muito além do cenário atual e pós-pandemia — e que exigem um novo mindset aos gestores e vendedores.

“Não estamos falando em ‘pensar fora da caixa’, como muito se dizia até então; agora será necessário jogar a caixa fora e pensar com verdadeiras possibilidades de inovação”, diz o professor da área de vendas e negociação do LABFIN.PROVAR – FIA, Lauro Xerfan Neto.

Autor do livro “Comportamento ideal de vendas” e proprietário da Xerfan Consultoria Empresarial, ele acredita que o cuidado com a experiência do cliente, mais do que nunca, deve ser a grande preocupação dos profissionais de vendas.

“As perguntas que temos que nos fazer são: O que estamos fazendo para esse cliente se sentir seguro e acolhido? Quais foram nossas grandes mudanças para ele perceber a nova experiência que estamos lhe trazendo? De fato essa nova experiência trará uma experiência extraordinária para meus clientes?”, reflete ele.

Conversamos sobre os principais desafios para os gestores e equipes de vendas no atual contexto e no pós-pandemia e como eles podem se reinventar, tanto no B2B quanto no B2C, para incrementar a qualidade da experiência dos clientes.

Abaixo, você confere os principais insights e reflexões do Prof. Lauro Xerfan Neto.

***

Gestão e relacionamento a distância no “novo normal de vendas”

O desafio dos gestores é proporcionar uma gestão a distância da própria atividade da área de vendas para o cumprimento do alcance de resultados e a construção de relacionamentos dos seus times de vendas com os clientes, proporcionando-lhes mentoria e coaching a distância.

Esse mesmo desafio cabe aos vendedores, no segmento B2C, acostumados ao acolhimento muito intenso com os clientes, muitas vezes com aperto de mão, um toque no ombro e, às vezes, até um abraço, na entrada da loja e na saída dela.

Já no segmento B2B o relacionamento sempre falou muito alto, as visitas presenciais sempre foram condição quase que obrigatória da atividade. Para ambos os mercados (B2C e B2B), podemos dizer que a maioria das relações era analógica, ou seja, face to face (cara a cara). E agora? Bom, agora o desafio da reinvenção é mais importante que nunca.

O principal desafio está em se adaptar rapidamente ao mundo remoto (e virtual), reuniões acontecerão a distância no B2B, por exemplo. Já para o B2C investir no online se tornou questão obrigatória para o sucesso: e-commerce combinados com sites institucionais mais acolhedores, WhatsApp para ações comerciais rápidas e possibilidade de envio de mercadorias se tornam parte do “novo normal de vendas”.

H2H, de ser humano para ser humano

Temos que ter em mente que seja B2C ou B2B as relações comerciais são relações humanas — ou seja, H2H, de ser humano para ser humano) —, e antes da pandemia, durante a pandemia e pós-pandemia, essa é a relação estratégica que sempre prevalecerá.

As metas estão aí, não caíram, muitas até subiram; o desafio está na reinvenção da busca do resultado através de um novo comportamento humano, H2H. Mas eu quero fugir do clichê empresarial que diz que todas as crises são oportunidades disfarçadas, pois uma crise como essa, na verdade, é uma demandante intensa e agressiva da revisão drástica das estratégias de vendas das empresas, bem como dos comportamentos dos gerentes de vendas e seu time de vendedores.

Experiência do cliente como pilar da gestão de vendas

Mais que nunca, a “experiência do cliente” se torna um dos pilares mais importantes nas estratégias das empresas. Esse pilar transcende a área comercial para toda a empresa, mas, claro, se o ponto de contato com o cliente são os vendedores, mais que nunca esse time de colaboradores tem que estar por dentro dessas táticas comportamentais e técnicas para trazer resultados verdadeiros.

Consumo da experiência

Pensar na experiência do cliente é se atentar a todos os pontos de interação e identificação dele com sua empresa, marca, produto e/ou serviço; mas não se engane, isso vai além das estratégias de relacionamento.

Se antes vivíamos a experiência do consumo, no pós-pandemia vamos literalmente viver o consumo da experiência. Por isso, estar preparado para entender o “novo cliente” no “novo hábito de consumo e compra” é fundamental. Questões como conhecer profundamente tecnologias de contato se tornam habilidades obrigatórias para esse executivo de vendas.


Atenção à jornada do cliente

Os profissionais de vendas que não tiverem atenção obsessiva aos detalhes provavelmente deixarão muitas oportunidades de lado. Os clientes vão esperar aquele “algo mais” que a concorrência não faz; por isso, o foco está em cuidar da jornada do cliente, perceber os pontos de interação desta jornada com sua empresa, produto e/ou serviço. E você, profissional de vendas, deverá atuar diretamente para potencializar experiências memoráveis, facilitar o trabalho do seu cliente e, ao mesmo tempo, eliminar as interações frustrantes.

Jornada do cliente no B2C

Nestes tempos de isolamento, distanciamento e cuidados intensos de contato, o que pode ser feito para que um cliente se sinta confortável ao entrar numa loja (B2C)? Tirando o tradicional display de álcool em gel, entre outros aparatos tradicionais de cuidados, algumas lojas pelo mundo já criaram, por exemplo, cores de cesta por meio das quais o cliente indica se precisa da ajuda de um vendedor ou se quer apenas realizar suas compras sem ser incomodado. Isso é pensar na jornada do cliente e cuidar da interação dele com sua empresa, produtos e serviços. Aqui, neste exemplo, o vendedor da loja já sabe como agir corretamente.

Experiência do cliente no B2B

E no B2B, por exemplo, o executivo de venda que irá realizar uma reunião com seu cliente, ter previamente o cuidado de saber qual plataforma de videoconferência ele tem maior conforto para utilizar, ou até mesmo ter a disposição de “ensinar” seu cliente a utilizar recursos básicos de uma dessas plataformas para obter melhor conforto na interação e, assim, atingir o sucesso esperado da reunião. O olhar para a jornada e experiência do cliente se tornam os pilares principais de sucesso das vendas no comportamento dos clientes e consumidores em tempos de pandemia.

Transformação digital e vendas em B2B

A tecnologia sempre esteve aí, mas a pandemia acelerou esse processo de aderência a ela. Estamos fazendo algo agora que faríamos talvez em 10 anos pra frente. A genialidade das empresas está em sua capacidade de se adaptar, mas muito raramente isso é feito voluntariamente.

Para o segmento B2B, os gestores e equipes comerciais que vão se dar melhor frente às transformações digitais serão aqueles que melhor trabalharem as estratégias e táticas de vendas, porém com o olhar para o novo contexto digital. Questões deverão ser repensadas na melhor forma de como fazer:

[1] Prioridades da carteira: que critérios usar? com quais clientes posso ter mais sucesso virtualmente?
[2] Planejamento das reuniões virtuais: que tecnologia usar? como construir interação com equilíbrio entre ouvir e falar? quais as ferramentas disponíveis para todos?
[3] Condução das reuniões virtuais: cuidar de fatores como imagem, som e ambiente do entorno; papéis de cada um e o uso do tempo, dosagem do calor humano versus a formalidade necessária.
[4] Próximos passos: como construir um avanço comercial através de um bom fechamento da reunião, como construir compromissos entre as partes. Conhecer o uso das tecnologias se tornou obrigatoriedade, a nova realidade não é mais saber usar o Waze, e sim o ZOOM.US, Microsoft Teams, Skype, Webex Meeting, entre muitos outros recursos tecnológicos.

Agilidade e tecnologia na gestão de vendas B2C

Para o segmento B2C, o foco está em usar e abusar das tecnologias de vendas remotas em plataformas virtuais. Um grande exemplo é o Magazine Luiza, que rapidamente proporcionou a milhares de pequenos e médios lojistas uma forma de “virtualizar” sua loja e chegar até seus consumidores remotamente.

Nesse caso, o desafio maior é atender a demanda de construção da confiança na venda, por exemplo, por meio de uma rápida resposta a alguma dúvida solicitada pelo cliente, um rápido retorno confirmando a compra e o prazo de entrega, o envio do acompanhamento do seu processo de compra, aprovação de crédito e transporte da mercadoria adquirida, entre muitos outros cuidados que estão ligados à experiência do cliente junto à jornada dele com sua empresa. No B2C o cuidado com a velocidade da interação remota pode encantar ou frustrar o cliente, então ser ágil se torna obrigatório para o sucesso.

Impactos duradouros da COVID-19

As empresas irão perceber que antes utilizavam muitos recursos financeiros para questões que, pensando na nova realidade, talvez não façam tanto sentido assim; verbas destinadas à logística de pessoas para deslocamentos de reuniões eram maiores que para treinamentos e desenvolvimentos dessas pessoas, por exemplo.

Tempos gastos com deslocamento, trânsitos, salas de esperas não fazem mais sentido. Hoje, sabemos que de duas ou talvez três reuniões de um dia inteiro de trabalho dedicado podem ser feitas virtualmente numa manhã ou numa tarde, tendo o resto do dia disponível para outras atividades.

Sem dúvida alguma, questões com cuidados pessoais permanecerão, talvez não na intensidade que estamos vivendo durante a pandemia, mas com a percepção do real valor e ganho que temos ao manter, por exemplo, um zelo maior com sistemas de higiene e cuidados num restaurante self-service, no uso de um transporte público, e em outras ocasiões em que existam riscos para a saúde por contato.

Humanologia na gestão de vendas e nas empresas

O fato é que, antes da pandemia, durante a pandemia e no pós-pandemia, as empresas que construirão um verdadeiro legado serão aquelas cujos colaboradores, incluindo a equipe de vendas, apresentem de fato, em suas habilidades e comportamentos, a chamada humanologia.

Humanologia é um comportamento humano que permite trabalhar com dignidade, graciosidade e nobreza em todas as situações; a relação humana é mais importante que tudo. Otimizar a comunicação, viver para o outro e se comportar através da cultura de servir permitem construir organizações saudáveis, felizes e sagradas. Afinal, humanologia é a capacidade comportamental do verdadeiro acolhimento ao cliente, para que ele saia melhor do que entrou, seja de uma loja, de uma reunião, de uma jornada, de uma experiência.